Literatura - Reino de Deus- Teu é o Reino


Capítulo 9 - O Reino Tornou-se Possível


O REINO TORNOU-SE POSSÍVEL

Para a maioria das pessoas a morte de Jesus na cruz é o aspeto central da mensagem Cristã, e você pode ter ficado algo surpreendido de que num livro sobre a obra de Jesus, até aqui tenha-se mencionado escassamente o seu sacrifício. A razão é que a morde de Jesus na cruz foi o meio para atingir um fim, e não o próprio fim. Mas tendo considerado nos capítulos anteriores o objetivo, o estabelecimento na terra do Reino de Deus, no qual homens e mulheres imortais terão a vivência dum verdadeiro companheirismo com o seu Criador, agora devemos considerar os meios pelos quais esse futuro tornou-se possível. Afastaremo-nos do nosso quadro de Jesus como o grande e poderoso rei para ver Jesus o homem, humilde, amoroso, e que entrega a sua vida pelo bem-estar da humanidade.

O que conseguiu com o seu sacrifício?

Desde os primeiros tempos da existência do homem na terra tem havido uma barreira entre ele e o seu Criador. A Bíblia chama essa barreira de pecado, e a missão de Jesus na sua vida mortal foi tornar possível a eliminação do pecado para reconciliar o homem com Deus. Este capítulo examina primeiro o que se dá a entender por pecado e como se originou, e depois consideraremos a vitória duramente ganha por Jesus através da qual o mundo pode ser salvo dos seus efeitos.

O QUE É O PECADO?

A par do fio de outro do Reino de Deus, o tema do pecado aparece por toda a Bíblia, desde os primeiros capítulos de Génesis até aos finais de Apocalipse. Entre o início e o fim das Escrituras existem centenas de alusões ao pecado. Se incluirmos palavras relacionadas como ofensa, iniquidade e transgressão, o número de alusões ao tema geral se multiplica, e virtualmente vê-se que o pecado é mencionado de um modo ou outro em todos os livros das Escrituras.

Se se pergunta, o que entende você por pecado? Muitas pessoas provavelmente dirão que é uma má conduta como roubar, mentir ou assassinar. Por outras palavras, geralmente pensa-se que o pecado são os erros mais óbvios que o homem pode cometer. No entanto, em termos Bíblicos o pecado é muito mais do que isto. A palavra que os escritores inspirados usaram indica um desvio do caminho, ou errar um tiro ao alvo. Encontramos um exemplo no livro de Juízes onde é dito que alguns guerreiros "atiravam com a funda uma pedra num cabelo e não erravam" (Juízes 20:16). A palavra traduzida errar é a mesma que se traduz centenas de vezes pecado.

Isto demonstra a ideia por de trás da palavra "Pois todos pecaram e carecem da glória de Deus." (Romanos 3:23)

A "glória de Deus" mencionada aqui não inclui somente a Sua presença física, mas inclui especialmente os Seus atributos perfeitos. Certa vez disse Moisés a Deus "Rogo-te que me mostres a tua glória." (Êxodo 33:18). Quando este pedido foi concedido a ênfase divina esteve na revelação das Suas qualidades morais:

"E, passando o SENHOR por diante dele, clamou: SENHOR, SENHOR Deus compassivo, clemente e longânimo e grande em misericórdia e fidelidade... ainda que não inocenta o culpado..." (Êxodo 34:6-7).

Que a glória de Deus consiste primeiro das Suas qualidades morais em vez da Sua presença física foi expressado por João quando falou de Jesus:

"...Habitou entre nós cheio de graça e de verdade, e vimos a sua glória, glória como do unigênito do Pai." (João 1:14)

Quando Jesus esteve na terra não manifestou a glória literal de Deus. A maneira como Jesus mostrou a glória do seu Pai, foi ao ser uma reflexão perfeita do caráter de Deus. A glória de Deus é por conseguinte a totalidade das Suas virtudes, tais como as que consideramos no capítulo 3. Segundo Paulo ter pouco desta glória, ou falhar em alcançar tal estatura, é pecado. Em vista desta definição não é estranho que "todos pecaram."

Isto leva-nos a notar outras palavras da Bíblia que descrevem o pecado. João escreveu na sua carta:

"Toda injustiça é pecado." (1 João 5:17)

"Porque o pecado é a transgressão da lei." (1 João 3:4)

Você pode ver que isso expressa a mesma ideia. Já consideramos a retidão e justiça de Deus no capítulo 3 e vimos que estes termos descrevem os Seus perfeitos atributos. A injustiça do homem, o fato de que não vive em retidão, constitui pecado no sentido das Escrituras, até quando aparentemente mantenha uma vida boa e sem mancha. Similarmente, o pecado é a infração da lei, um estado mental no qual a pessoa não aceita as leis de Deus como regra para a sua vida, e não as obedece.

Note que isto é verdade mesmo que a pessoa não conheça os atributos ou a vontade de Deus. As pessoas são culpáveis de pecado ainda que nunca tenham ouvido falar das leis de Deus. Nisto não há nada que não seja sensato: até no nosso sistema legal a ignorância da lei do país não é uma defesa se a pessoa transgride essa lei.

Deus deu também à humanidade leis específicas que deve obedecer: a Bíblia está cheia de referências sobre as coisas que podemos fazer ou não. Aqueles que conhecem estes mandamentos mas não os obedecem pecam numa escala maior. Este pecado causado pela desobediência dum mandamento específico de Deus, é chamado geralmente de transgressão. Como a palavra o indica, isto implica passar a linha ou regra que foi colocada por Deus.

Sendo assim, somos pecadores por duas razões possíveis: primeiro, pelo fato de que em termos gerais não manifestamos as caraterísticas de Deus, e em segundo lugar, devido a uma transgressão direta da Sua lei por todos os que a conhecemos. O pecado no primeiro caso pode ver-se como um estado ou condição duma pessoa ou sociedade, e no segundo como a desobediência de mandamentos específicos de Deus por aqueles que conhecem a vontade de Deus.

O PECADO É UNIVERSAL

Com esta definição de pecado não nos surpreenderá descobrir que toda a humanidade é culpada. Já observamos as palavras de Paulo, "todos pecaram," e existem muitas outras referências similares:

"Pois já temos demonstrado que todos... estão debaixo do pecado." (Romanos 3:9)

"Mas a Escritura encerrou tudo sob o pecado." (Gálatas 3:22)

"... que tira o pecado do mundo!" (João 1:29)

Assim que poderia-se dizer que o pecado e a "constituição" do mundo. Nos sistemas humanos de governo cada nação tem a sua constituição através da qual é governada, e cada pessoa nascida nesse território herda essa constituição, que lhe agrade ou não. De maneira similar cada um dos que nascem na terra vêm a um mundo onde a tendência de pecar é inerente à própria natureza de cada ser humano e a cada aspeto da sua sociedade. Assim sendo, o pecado "reina" em todos os assuntos do homem (Romanos 5:21).

O EFEITO DO PECADO

Tendo nascido na terra onde reina o pecado, não nos é fácil apreciar o efeito que tem o pecado. Forma uma grande parte da experiência diária humana, pelo que os seus resultados são vistos como circunstâncias normais. De fato o reino do pecado tem efeitos incalculáveis.

Um resultado é a nossa separação de Deus. Já que não tivemos a experiência da intimidade do companheirismo divino, torna-se-nos difícil visualizar os efeitos da sua ausência. Mas a Bíblia claramente ensina que a presença do pecado levanta uma barreira entre o homem e o seu Criador:

"Mas as vossas iniquidades fazem separação entre vós e o vosso Deus; e os vossos pecados encobrem o seu rosto de vós, para que vos não ouça." (Isaías 59:2)

"O pendor da carne é inimizade contra Deus." (Romanos 8:7)

A terra é uma mancha negra no universo. Através de vastas distâncias no espaço Deus é uno com a Sua criação pois, como disse Jesus na sua oração, faz-se a vontade de Deus nos céus. Mas isto não é verdade em relação ao nosso planeta. Metaforicamente falando, Deus não pode olhar para a terra por causa do pecado:

"Tu és tão puro de olhos, que não podes ver o mal" (Habacuque 1:13)

Assim, se Deus vai cumprir o Seu plano de vir e habitar entre os homens no Reino perfeito de Deus, isto significa que de alguma maneira o pecado terá que ser removido da terra.

Outro resultado do pecado é uma terra sob a maldição do sofrimento e pecado. A morte é uma experiência tão normal que é difícil pensar que é o resultado do pecado. Mas é o claro ensino da Bíblia:

"Porque o salário do pecado é a morte." (Romanos 6:23)

"O pecado, uma vez consumado, gera a morte." (Tiago 1:15)

Você talvez lembre-se da profecia Bíblica citada no capítulo 2, a qual predisse que quando o Reino de Deus chegar à sua etapa final "a morte já não existirá" (Apocalipse 21:4), implicando a abolição da causa da morte, o pecado. Assim, o esquema de Deus para a remoção do pecado e a reconciliação do mundo com Ele faz parte do fio de ouro do Reino de Deus assinalado pela Bíblia. Já vimos que o perdão de pecados foi um aspeto da promessa que Deus fez a Abraão; mas para encontrar o início do fio devemos voltar atrás até próprio início da Bíblia. Aqui aprendemos que a inclinação para pecar tornou-se parte da própria estrutura da humanidade e conseguiu a dominação do mundo.

A ORIGEM DO PECADO

Nesta secção consideraremos os acontecimentos no jardim do Éden como verídicos. Esta é o único ponto de vista aceitável para um seguidor de Jesus. Ele refere-se a Adão e Eva como pessoas históricas, e as circunstâncias da sua queda como acontecimentos literais (Mateus 19:4-5). Os Apóstolos, ao escreverem o Novo Testamento, os consideraram da mesma maneira. A doutrina completa da redenção entre Deus e o homem torna-se incompreensível sob qualquer outra base.

A cena inicial da Bíblia é deleitosa (Génesis 2). O casal recém criado vivia num belo parque campestre cheio duma variedade de árvores ornamentais e de fruto. Mananciais e rios regavam este paraíso do Éden e nada manchava a felicidade de Adão e Eva. Especialmente deleitosa era a sua associação com Deus. De uma maneira que não foi revelada eles conversavam com o seu Criador, e com toda a probabilidade informou-lhes acerca de Si mesmo, educou-os, e instruí-os nos princípios duma forma correta de vida.

No entanto, desde o ponto de vista de Deus este arranjo tinha um inconveniente. O seu propósito não estaria completo somente com o ato de criar o mundo. Lemos nos salmos que Deus obtém pouco prazer com as coisas meramente físicas:

"Não faz caso da força do cavalo, nem se compraz nos músculos do guerreiro." (Salmo 147:10)

Só poderia obter verdadeira satisfação quando a sua criação Lhe respondesse com amor. Assim, continua o salmista:

"Agrada-se o SENHOR dos que o temem." (Salmo 147:11)

Este prazer não se realizava pela servil obediência de Adão e Eva como se fossem robôs. O que produz prazer e satisfação a Deus é quando as pessoas que enfrentam uma decisão escolhem deliberadamente fazer o que é correto para agradar-Lhe, mostrando assim a sua confiança Nele. Por outras palavras quer pessoas de caráter.

Com este objectivo Ele preparou uma prova de lealdade. Indicou ao casal uma árvore especial de fruto apetitoso e disse-lhes que não comessem dela nem lhe tocassem:

"E o SENHOR Deus lhe deu esta ordem: De toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás." (Génesis 2:16-17)

Adão ouviu estas palavras com todo o poder de entendimento que Deus lhe tinha dado, sem dúvida ponderando no seu significado e refletindo sobre elas vez após vez. Quantas vezes o casal passou junto à árvore, afastando-se para não ofender Deus e trazer ruína sobre eles, não o sabemos. Até então nada tinha acontecido que os induzisse a desobedecer a Deus. Mas um dia, quando Eva estava só, aproximou-se uma serpente. O animal tinha certa habilidade de raciocínio e poder da fala, e começou a semear sementes de dúvida na mente da mulher:

"É assim que Deus disse: Não comereis de toda árvore do jardim?" (Génesis 3:1)

Ela respondeu demonstrando que tinha completamente entendido o mandamento de Deus:

"Do fruto das árvores do jardim podemos comer, mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Dele não comereis, nem tocareis nele, para que não morrais." (Génesis 3:2-3)

A serpente rejeitou isto terminantemente. Deus estava tentando proteger a Sua posição, segundo o seu raciocínio. Se vocês comerem deste fruto instantaneamente tornar-se-ão tão sábios como Ele, e maravilhosas perspetivas de conhecimento e entendimento se abrirão perante vós. Certamente a morte está fora de questão.

"Então, a serpente disse à mulher: É certo que não morrereis. Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se vos abrirão os olhos e, como Deus, sereis conhecedores do bem e do mal." (Génesis 3:4-5)

A mulher duvidou. Esta serpente que fala terá razão? Estaria Deus a esconder algo que seria de benefício para eles? Tinha-lhes infundido o temor da morte só para evitar que partilhassem do Seu conhecimento e sabedoria? A semente de dúvida implantada começou a crescer; e com o fruto tentadoramente pendurado nos ramos, a confiança de Eva em Deus enfraqueceu-se e então se extinguiu. Estendendo as suas mãos tomou do fruto e comeu-o. Encontrou Adão e, sem dúvida depois das convenientes explicações, ele partilhou do fruto com ela.

Desta maneira entrou o pecado no mundo.

O RESULTADO DA TRANSGRESSÃO

Pense no que tinham feito Adão e Eva. A sua desobediência não tinha sido um pequeno deslize ou um erro acidental, mas sim um desafio descarado a Deus. Ele tinha-lhes dito que se O desobedecessem morreriam. Eles efetivamente responderam-lhe, "Não acreditamos em ti." Deus tinha-se-lhes revelado como o Seu Criador e Instrutor. Eles no seu orgulho procuraram uma imediata igualdade mental com ele. Tinham colocado a sua própria vontade em desafiante oposição à vontade de Deus. Tinham desafiado a supremacia de Deus.

Para um Deus que é absolutamente supremo e cujos pensamentos e ações são completamente justas isto era um desafio que não podia ser tolerado, como tampouco a pena de morte poderia ser anulada. Assim, como já veremos, a sentença de morte foi pronunciada sobre o homem pecador.

O desagrado de Deus não foi imediatamente demonstrado dando ao casal pecador tempo para dar-se conta da sua nova situação. O fruto proibido tinha feito o seu trabalho, ao abrir os olhos para ver as coisas com ideias bem diferentes das anteriores (Génesis 3:7). A primeira coisa de que se aperceberam foi que estavam nus. Algo que antes lhes parecera perfeitamente natural e inocente agora parecia vergonhoso. Mesmo que possivelmente não se tivessem dado conta no momento, a sua nudez resumia o seu caráter pecaminoso. Sentindo uma necessidade instintiva de cobrirem-se apressaram-se em coser grandes folhas de uma figueira que estava perto como simples aventais e cobriram-se. Este foi um ato muito significativo. Instintivamente sentiram necessidade de cobrir os resultados do seu grande pecado. Eles não poderiam aparecer nus diante de Deus.

Mas a temida confrontação não tardava estaria aí. Quando o sol começou a afundar-se no ocidente. Adão e Eva esperavam a sua costumeira conversa com Deus. Então veio o som da voz que tinha sido a sua vida e gozo, mas agora paralisava os seus corações com terror. "Adão, onde estás?" Mas Adão estava escondido entre as árvores, apercebendo-se que a sua coberta artificial que à pressa tinha preparado era ineficaz para esconder o seu pecado da vista de Deus. Não há dúvida que ele estava consciente que a sua transgressão tinha-o separado do seu Criador, e tinha destruído o companheirismo e comunhão existentes entre eles.

"Ouvi a tua voz no jardim, e, porque estava nu, tive medo, e me escondi."

"Quem te fez saber que estavas nu? Comeste da árvore de que te ordenei que não comesses?" (Génesis 3:10-11)

Envergonhado, o casal saiu do seu esconderijo para receber uma sentença justa sobre as suas ações. Os três participantes foram advertidos por turnos, e a mensagem completa foi que enquanto o prospeto imediato era sombrio e de mau presságio, havia um raio de luz que apontava à remoção final da separação entre Deus e o homem que apenas começara.

A SENTENÇA DE ADÃO

O castigo de Adão foi uma vida de esforço e duro trabalho tentando produzir alimento numa terra agora maldita por sua culpa: as colheitas cresceriam somente com dificuldade e pesar. No final o homem morreria e regressaria novamente ao pó do qual tinha sido criado no princípio (Génesis 3:17-19).

Esta maldição não somente foi aplicada a Adão, mas também a toda a sua posteridade. Eles herdariam a sua natureza pecaminosa e partilhariam da pena de morte. O comentário do Novo Testamento acerca disto é muito claro:

"Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram." (Romanos 5:12)

Estamos num ponto conveniente para enfatizar dois pontos acerca do pecado e as suas consequências. Primeiro, a Bíblia sempre atribui a origem e continuação do pecado ao homem, e a ele somente. Nenhum agente externo pode ser culpado pela sua situação. O homem peca "é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz." (Tiago 1:14)

Em segundo lugar, o castigo pelo pecado significa o fim completo da existência. A ideia de que na morte um componente imortal do homem continua uma existência consciente, é totalmente alheia ao ensino da Bíblia. A morte seria dificilmente um castigo sob tais condições. Falando com Deus, David diz:

"Pois, na morte, não há recordação de ti; no sepulcro, quem te dará louvor?" (Salmo 6:5)

Muitas outras passagens ensinam o mesmo:

"Porque os vivos sabem que hão de morrer, mas os mortos não sabem coisa nenhuma." (Eclesiastes 9:5).

"Sai-lhes o espírito, e eles tornam ao pó; nesse mesmo dia, perecem todos os seus desígnios." (Salmo 146:4)

Mas a morte, ainda que real em todos os sentidos, não é necessariamente o fim de uma pessoa. Existe uma esperança mais além do túmulo, como veremos mais adiante.

A SENTENÇA DE EVA

O tema da dor e do pesar continuou no castigo de Eva. A angustia dela chegaria nas dores de parto e também no fato de que ocuparia uma posição subordinada na relação entre o homem e a mulher (Génesis 3:16).

De conformidade com este relato os castigos de Adão e Eva, poderia parecer que a humanidade estava sem esperança. Eles tinham desprezado deliberadamente as leis do Deus Todo-poderoso, opondo a sua vontade à d'Ele. Ele os tinha prevenido da Sua resposta e agora estava com justiça a pedir contas do seu pecado. Neste caso era impossível que Deus simplesmente perdoasse o homem, mesmo que o Seu amor e misericórdia desejassem a reconciliação. Como vimos no final do capítulo 3, a justiça de Deus e a Sua misericórdia pareciam estar em oposição, mas Ele idealizou uma forma pela qual o Seu amor poderia se manifestar sem comprometer de nenhuma maneira a Sua justiça e retidão. Na Sua sentença à serpente Deus deu uma ideia do Seu plano.

A SENTENÇA DA SERPENTE

Aqui apareceu o primeiro raio de esperança. Já que era a que tinha encorajado Adão e Eva a pecar, a serpente ia ser maldita: um castigo que a reduziria a uma posição baixa e desprezível na criação. Mas ao mesmo tempo Deus prometeu a liberdade final da maldição que a serpente tinha ajudado a trazer ao mundo. Dirigindo-se à serpente disse Deus:

"Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar." (Génesis 3:15)

Aqui há outro versículo chave das Escrituras, e de novo vemos que o cumprimento devia envolver a obra das descendências prometidas. A mulher teria um descendente e a serpente também teria descendentes, e haveria inimizade entre eles. O descendente da mulher infligiria uma ferida na cabeça da serpente, a qual por dedução seria fatal - a serpente morreria. Mas no curso deste conflito a serpente feriria o descendente da mulher no calcanhar, uma ferida que não seria fatal, pelo que o descendente da mulher haveria de recuperar-se.

A seguinte tabela ajudará a esclarecer esta relação

A serpente terá inimizade com a mulher
Os descendentes da serpente teriam inimizade com o descendente da mulher
A cabeça da serpente será ferida pelo descendente da mulher
A serpente ferirá o calcanhar do descendente da mulher

Obviamente estas são alusões figuradas. O que representam?

A SERPENTE E A SUA DESCENDÊNCIA

A serpente foi a causa indireta da entrada do pecado no mundo, pelo que se converte numa figura conveniente do próprio pecado. Os que vivem governados pelo pecado são por conseguinte descendência da serpente. "Filhos da serpente" é uma descrição Bíblica dos que se opõem às normas de Deus. Jesus dirigiu-se aos ímpios Fariseus como "Serpentes, raça de víboras!" (Mateus 23:33). Noutras ocasiões está claro que se refere a eles com esta passagem de Génesis em sua mente (João 8:44). Assim "a serpente" que será destruída pelo "descendente da mulher" é uma personificação do pecado manifestado na natureza humana, e aqueles nos quais está presente são "descendência" da serpente.

É apropriado mencionar aqui que na Bíblia, o pecado na sua oposição a Deus é personificado de outras maneiras. A personificação é uma figura de estilo(linguagem, BR) usada frequentemente, na qual uma ideia abstrata é descrita como uma pessoa. Abundam exemplos em toda a literatura e são prontamente entendidos:

"A Esperança fugiu murcha, e a Misericórdia suspirou a Despedida" (Byron, A prometida de Abidos")

"Grita na rua a Sabedoria, nas praças, levanta a voz." (Provérbios 1:20)

Um exame cuidadoso do uso Bíblico dos termos como "o diabo" e "satanás" mostrará que eles também são personificações do pecado, e não se referem a um monstro mau e sobrenatural.

O DESCENDENTE DA MULHER

À mulher foi prometida uma descendência que destruiria a serpente, que quer dizer, o poder do pecado. Como no caso da descendência de Abraão e da semente de David, esta pessoa prometida é Jesus. Aludindo à promessa do Éden de que a mulher teria um filho, lemos no Novo Testamento:

"Vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher..." (Gálatas 4:4)

No bem conhecido capítulo 53 de Isaías é predita claramente a vinda de um que salvaria a humanidade dos efeitos do pecado. Aqui de novo a linguagem lembra-nos a promessa que Deus fez no Éden de que no processo de destruição do pecado o descendente da mulher sofreria uma ferida temporal às mãos do pecado:

"Mas ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados... mas o SENHOR fez cair sobre ele a iniquidade de nós todos... Todavia, ao SENHOR agradou moê-lo, fazendo-o enfermar; quando der ele a sua alma como oferta pelo pecado, verá a sua posteridade... com o seu conhecimento, justificará a muitos, porque as iniquidades deles levará sobre si." (Isaías 53:5-6, 10-11)

PRINCIPAIS CARATERISTICAS DA PROMESSA NO ÉDEN

Um breve resumo pode ajudar-nos a fixar em nossas mentes os principais aspetos da promessa.

O castigo do homem:

A terra seria amaldiçoada por sua causa.

A vida seria difícil e penosa.

O homem morreria e voltaria ao pó.

Todos os descendentes de Adão nasceriam com a sua natureza sujeita à maldição pelo pecado e, por conseguinte morreriam.

A sentença da serpente:

O pecado seria finalmente destruído.

O castigo da mulher:

Dores de parto.

Sujeição ao esposo.

Mas (aqui surge a promessa da remoção do pecado), o seu "descendente" (Jesus) mataria a serpente enquanto que em fazer tal receberia uma ferida temporária.

VESTIMENTAS DE PELE

Para além de falar com Adão e Eva sobre a obra do descendente da mulher acerca da reconciliação entre Deus e o homem, Deus também proporcionou-lhes uma lição objectiva de como seria perdoado o pecado. Já vimos que imediatamente depois de terem pecado, os nossos primeiros pais deram-se conta da sua nudez e tentaram escondê-la preparando aventais com folhas de figueira. Estas nudez veio a ser um símbolo do seu pecado e o uso de aventais equivalia à tentativa de cobrir o pecado pelo seu próprio esforço, o que se verificou ser impossível. Então Deus realizou um ato muito significativo:

"Fez o SENHOR Deus vestimenta de peles para Adão e sua mulher e os vestiu" (Génesis 3:21)

Esta ação ensinou a Adão duas coisas. Primeiro, a humanidade não podia cobrir o pecado por si mesma; só Deus poderia fazer isto. Em segundo lugar, as peles provinham de uma animal sacrificado, ensinando que a coberta para o pecado só poderia conseguir-se com a morte. O animal que com sua morte proveu vestimentas de pele, estava a prefigurar a morte do descendente da mulher para cobrir os pecados do mundo.

Deus enfatizou isto à nova geração. Quando Caim, o filho de Adão, ofereceu frutos como sacrifício a Deus, foi rejeitado. Era o equivalente das folhas de figueira que Deus já tinha indicado como inúteis para cobrir o pecado. O seu outro filho, Abel, reconheceu a verdade de que o perdão só seria alcançado através da morte, e o seu sacrifício de um cordeiro foi aceite.

Deste modo os princípios da redenção humana foram estabelecidos desde o princípio da história humana, e registados em Génesis, de tal maneira que as gerações posteriores pudessem esperar a vinda do Redentor que morreria pelos pecados da humanidade.

JESUS O SALVADOR

Ainda que o ensino do Antigo Testamento sobre o sacrifício de Jesus não seja possivelmente muito bem conhecido, é reconhecido sem dúvida alguma como o aspeto principal do Novo Testamento. Visto que é mencionado vez após vez o fato de Jesus ter-se oferecido a si mesmo na crucificação para perdão de pecados. Ao anunciar o nascimento do Salvador o anjo disse:

"Ela dará à luz um filho e lhe porás o nome de JESUS, porque ele salvará o seu povo dos pecados deles." (Mateus 1:21)

Os Apóstolos aludem continuamente ao perdão de pecados e à reconciliação com Deus como resultado do sacrifício de Cristo:

"Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras." (1 Coríntios 15:3)

"Se manifestou uma vez por todas, para aniquilar, pelo sacrifício de si mesmo, o pecado." (Hebreus 9:26)

"Mas Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores." (Romanos 5:8)

"No qual temos a redenção, pelo seu sangue, a remissão dos pecados" (Efésios 1:7)

"Havendo feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele, reconciliasse consigo mesmo todas as coisas" (Colossenses 1:21-22)

"Carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados." (1 Pedro 2:24)

"...Salvador Cristo Jesus, o qual a si mesmo se deu por nós, a fim de remir-nos de toda iniquidade" (Tito 2:13-14)

"Foste morto e com o teu sangue compraste para Deus." (Apocalipse 5:9)

Porque tinha o mundo que esperar pela vinda do seu Salvador? Porque não pode qualquer homem ter sacrificado a sua vida para efetuar a ansiada reunião com Deus? A resposta é que o sacrifício de si mesmo não bastava. Tinha que ser verdadeiramente a oferenda dum membro representativo da raça humana, ainda tinha que ser também a oferenda de um que nunca tivesse pecado. Jesus foi o único que pode reunir estes dois requisitos.

JESUS PARTILHOU DA NOSSA NATUREZA HUMANA

Já antes me referi ao insólito parentesco de Jesus. Por ter sido gerado através do Espírito Santo era Filho de Deus; mas por causa da sua mãe humana, também era Filho do Homem - "Cristo Jesus, homem" (1 Timóteo 2:5). A Bíblia manifesta claramente que Jesus possuía a mesma natureza física que o resto da humanidade tinha herdado de Adão, e estava sujeito à mesma tentação para pecar:

"Visto, pois, que os filhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele, igualmente, participou, para que, por sua morte, destruísse aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo." (Hebreus 2:14)

"Por isso mesmo, convinha que, em todas as coisas, se tornasse semelhante aos irmãos." (Hebreus 2:17)

Note em ambas as passagens a ênfase repetida do facto de que Jesus era um verdadeiro representante da raça humana: "também", "participou", "igualmente". Era algo que Paulo precisava de destacar. Revertendo a frase Bíblica para chamar Jesus de "Deus filho" (um termo que não se encontra na Bíblia", e dando-lhe uma natureza diferente da nossa, não só é incorreto, mas torna impossível a obra redentora.

JESUS FOI SEM PECADO

No entanto, ainda que Jesus tinha as mesmas inclinações para o pecado como o resto da humanidade, ele pode vencer completamente os enganos que causavam a queda de outros, com o resultado que jamais pecou. Em nenhuma situação, Jesus foi "destituído da glória de Deus." Nunca foi desobediente à vontade de Deus. Ele com verdade pode dizer, " eu faço sempre o que lhe[ao Pai] agrada." Este grande feito é frequentemente mencionado nas Escrituras:

"Pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula." (1 Pedro 1:19)

"O qual não cometeu pecado, nem dolo algum se achou em sua boca." (1 Pedro 2:22)

"Nele não existe pecado." (1 João 3:5)

"Quem dentre vós me convence de pecado?" (João 8:46)

"Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; antes, foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado." (Hebreus 4:15)

A vitória total de Cristo sobre o pecado enquanto possuía a natureza humana fez do seu sacrifício uma base pela qual Deus podia perdoar o pecado do homem e outorgar a vida eterna. Mas antes de estudarmos isto com maior detalhe, detenhamo-nos na grandeza da sua conquista.

A VIDA E SACRIFÍCIO DE JESUS

Desde a sua infância Jesus dedicou a sua vida ao propósito do seu Pai de redimir a humanidade. No estudo das Escrituras - o nosso Antigo Testamento, foi a sua ocupação constante. Com elas e com a comunhão com o seu Pai através da oração separou-se para desempenhar o papel que os escritos sagrados lhe tinham traçado. Quando, aos trinta anos, começou a pregar as boas novas do Reino de Deus, as pessoas viram nele um homem ao qual nenhuma critica pessoal válida podia ser-lhe feita: um homem cujo conhecimento das Escrituras era inigualável nem pelos veteranos eruditos da época. Um homem cuja mensagem era apoiada por sinais milagrosos demonstrando que estava investido com o poder de Deus.

Aclamaram-no como sendo o longo esperado Messias, e pelo menos em uma ocasião tentaram obrigá-lo a tornar-se no seu rei crendo que de seguida chegariam as bênçãos prometidas. Mas Jesus sabia que o reinado teria de esperar a sua segunda vinda, e tentou preparar o seus ouvintes para a sua morte, a qual foi da mesma maneira predita pelos antigos profetas.

Durante todo este tempo Jesus suportou a crescente hostilidade dos líderes religiosos dos judeus, até que a animosidade entre os descendentes da serpente e o da mulher, predita muito antes no jardim do Éden, chegasse ao seu clímax. A integridade pessoal de Cristo e a sua denúncia da hipocrisia deles fez que seus oponentes tornassem-se invejosos e vingativos , pelo que o seu assassinato judicial pareceu ser o único caminho para silenciá-lo. Com o conhecimento dos governantes dos seus concidadãos foi comparativamente fácil alterar a opinião pública contra Jesus, e em poucos dias a multidão que o tinha aclamado na sua chegada a Jerusalém, agora pedia a gritos a sua crucificação.

Devemos recordar que Jesus tinha o poder de evitar tudo isto. Ele podia ter-se antecipado às ações dos escribas e Fariseus todas as vezes. Como ele próprio disse no momento da sua captura, poderia ter obtido mais de doze legiões de anjos para defesa sua. Mas tal ação teria evitado o plano divino da reconciliação humana, como ele próprio o disse:

"Como, pois, se cumpririam as Escrituras, segundo as quais assim deve suceder?" (Mateus 26:53-54)

Através do seu estudo das Escrituras, Jesus sabia que a serpente feriria o calcanhar do descendente da mulher, assim que voluntariamente se submeteu à sua captura e à dor e ignomínia que lhe sobrevieram. Ele podia ter-se livrado daquela humilhação e sofrimento, ou podia ter-se defendido no julgamento tornando inevitável a sua absolvição. Mas, em vez disso, foi para a cruz por sua livre vontade, a única compulsão sendo o seu imenso desejo de ser obediente à vontade de seu Pai, e o seu insondável amor pelos seus amigos.

A crucificação Romana era uma terrível tortura. Depois dos sacerdotes terem pressionado Pilatos para que aprovasse a sentença de morte, Jesus foi açoitado. Isto consistiu de trinta e nove golpes nas costas desnudas com um chicote guarnecido de bocados de osso. Com as suas costas feridas e a sangrar foi conduzido pelos soldados ao seu quartel onde, tendo escutado a sua pretensão de ser rei, colocaram-lhe um apertado anel de espinhos sobre a sua cabeça, como sendo uma coroa. Depois vestiram-no com um traje real e se ajoelhavam diante dele numa homenagem burlesca. Era costume obrigar o prisioneiro a levar o instrumento da sua própria morte, pelo que a cruz foi colocada sobre as costas em carne viva de Jesus, e assim fosse conduzido para fora da cidade para a sua crucificação. No lugar designado a cruz foi colocada no solo, e Jesus foi fixado a ela com grandes cravos. Não é necessária muita imaginação para dar-se conta da agonia que deve ter sentido quando a cruz foi levantada e introduzida no buraco na terra.

Por seis horas o único humano perfeito que jamais tinha vivido ficou pendurado ali em agonia, rodeado dos triunfantes e sarcásticos sacerdotes. Olhando à inscrição sobre a sua cabeça, "O REI DOS JUDEUS," disseram escarnecendo:

"Desça agora da cruz o Cristo, o rei de Israel, para que vejamos e creiamos." (Marcos 15:32)

Os pensamentos de Jesus enquanto pendia na cruz, e os acontecimentos daquele triste dia foram registados com antecedência no Antigo Testamento:

"Derramei-me como água, e todos os meus ossos se desconjuntaram; meu coração fez-se como cera, derreteu-se dentro de mim. Secou-se o meu vigor, como um caco de barro, e a língua se me apega ao céu da boca; assim, me deitas no pó da morte. Cães me cercam; uma súcia de malfeitores me rodeia; traspassaram-me as mãos e os pés. Posso contar todos os meus ossos; eles me estão olhando e encarando em mim. Repartem entre si as minhas vestes e sobre a minha túnica deitam sortes." (Salmo 22:14-18)

"O opróbrio partiu-me o coração, e desfaleci; esperei por piedade, mas debalde; por consoladores, e não os achei. Por alimento me deram fel e na minha sede me deram a beber vinagre." (Salmo 69:20-21)

Até em semelhante agonia mental e corporal o Salvador do mundo permaneceu fiel à vontade do seu Pai. Nem uma censura saiu de seus lábios, nem um pensamento de enfado passou pela sua mente, mantendo assim até ao fim a sua impecabilidade. Então quando sentiu que a sua força se desvanecia soube que tinha ganho a batalha. Foi com um glorioso sentido de triunfo que gritou com voz forte, "Está consumado!" e então entrou na inconsciência da morte.

Deste modo Jesus de Nazaré converteu-se no Salvador do mundo. Este era o preço que tinha que ser pago para que Deus e o homem pudessem reconciliar-se atingindo desta forma o desígnio final de Deus para a sua criação.

COMO FOI EFETIVO O SACRIFICIO DE CRISTO?

Ao tentarmos entender porque Jesus tinha que morrer na cruz para remover o pecado, nos aproximamos do limite da nossa capacidade mental. O plano de salvação pertence ao único que diz: "Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos, os meus caminhos, diz o SENHOR, porque, assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos, mais altos do que os vossos pensamentos." (Isaías 55:8-9). Em face a tal superioridade devemos aceitar sem qualquer dúvida que a morte do Seu Filho era a única maneira de cumprir o propósito de Deus. Uma crença incondicional neste fato é o requerimento essencial mesmo que razão para o sacrifício de Cristo não seja completamente entendida.

No entanto as Escrituras permitem algum discernimento sobre as razões pelas quais a morte de Cristo foi suficiente para obter o perdão dos pecados do homem. Mesmo uma vida inteira de estudo não bastará para entender todos os aspetos, alguns dos princípios divinos envolvidos podem ser vistos através de uma reverente análise da palavra de Deus.

Uma explicação comum da obra de Jesus compara a humanidade com um condenado à morte que espera a sua execução. Um amigo chega e oferece-se como substituto do criminoso, é aceite e morre em vez do culpado. Assim Deus aceitaria a morte de Jesus em vez da humanidade condenada. Mas a ideia de que Cristo sofreu um castigo em vez daqueles que o mereciam não coincide com os fatos do caso ou com o ensinamento da Bíblia. A razão diz-nos que se Cristo morreu em vez de nós, então já não deveríamos morrer; no entanto, morremos. Mas a ideia da substituição é particularmente incompatível com o que Deus revelou. Paulo descreve a morte de Jesus como uma declaração da justiça e retidão de Deus; enquanto que a morte dum homem inocente em vez de um culpado parece ser uma imitação grotesca de justiça.

Assim, com reverência perguntamos, que aconteceu na cruz que possibilitou o perdão de Deus para os pecados do homem? Porque foi a posição depois da morte de Cristo diferente da anterior à crucificação? Ao procurar as respostas na Bíblia para estas perguntas começamos a ver a maneira em que Deus na Sua infinita sabedoria projectou os meios de manter a Sua retidão e a Sua supremacia que exigia que os homens morressem pelos Seus pecados, mas ao mesmo tempo abriu um caminho pelo qual os pecados poderiam ser perdoados. Por outras palavras, veio a ser "Deus justo e Salvador" (Isaías 45:21).

A Bíblia estabelece um contraste entre o que fez Adão e o que alcançou Jesus. No Éden, Adão desobedeceu a Deus quando comeu do fruto proibido. Assim desafiou a supremacia de Deus colocando a sua própria vontade em oposição à vontade de Deus. É nos também mencionado um incentivo para o seu desafio. "Se vos abrirão os olhos e, como Deus, sereis conhecedores do bem e do mal." Esta foi a tentação da serpente. Esta possibilidade de conseguir igualdade com Deus foi uma das seduções à desobediência que recebeu o infeliz casal. Tal desobediência, contendo um desafio à soberania de Deus não podia ficar impune. A sentença de morte foi pronunciada como castigo pelo pecado de Adão, e todos os seus descendentes também semelhantemente morreram, porque todos pecaram.

Contrastemos esta situação com a situação na cruz. Jesus ofereceu-se a si mesmo como um homem que verdadeiramente representava toda a raça caída de Adão, com tentações idênticas para pecar, mas sem nunca ceder ao impulso para tal. Assim, ao contrário de Adão, que fez a sua própria vontade, Jesus subordinou a sua vontade completamente a Deus. Foi profetizado acerca dele no Antigo Testamento: "eis aqui estou, para fazer, ó Deus, a tua vontade" (Salmo 40:6; Hebreus 10:7). E ele recapitulou este aspeto da sua missão quando disse que veio "não para fazer a minha própria vontade, e sim a vontade daquele que me enviou" (João 6:38). Assim, Jesus, ao contrário do desobediente Adão, foi completamente obediente a Deus: "Embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelas coisas que sofreu" (Hebreus 5:8).

Existe outro contraste entre Adão e Cristo. Adão tentou igualar-se a Deus ao comer o fruto da árvore proibida. Jesus, mesmo sendo o verdadeiro Filho de Deus não tentou fazê-lo. Paulo diz-nos que ele "embora sendo na forma de Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se... e foi obediente até à morte, e morte de cruz!" (Filipenses 2:6-8 NVI)

Além do mais, no Éden Deus justamente castigou Adão com a morte. Em contraste, Jesus voluntariamente sacrificou a sua vida, e por este ato deliberado reconheceu que Deus tem o direito de manter a pena de morte pelo pecado.

Assim, no que Adão falhou, Jesus teve êxito.

Que conseguiu com isto? Vindicou a posição de Deus. Declarou-O justo. Esta é a explicação que deu Paulo e que agora devemos examinar.

A JUSTIÇA DE DEUS

Ao comentar sobre o esquema de redenção de Deus, Paulo disse numa das passagens chave acerca da morte de Cristo:

"Mas agora... se manifestou a justiça de Deus... mediante a fé em Jesus Cristo, para todos e sobre todos os que creem; porque não há distinção, pois todos pecaram e carecem da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus, a quem Deus propôs, no seu sangue, como propiciação[coberta para o pecado], mediante a fé, para manifestar a sua justiça, por ter Deus, na sua tolerância, deixado impunes os pecados anteriormente cometidos; tendo em vista a manifestação da sua justiça no tempo presente, para ele mesmo ser justo e o justificador daquele que tem fé em Jesus." (Romanos 3:21-26)

Com um cuidadoso estudo, vários pontos são extraídos destas palavras. Primeiro notamos que quatro vezes nesta passagem o sacrifício de Jesus é considerado como uma declaração da justiça de Deus. A seguir lemos que o resultado desta declaração é o perdão de pecados. É nos dito também que este perdão e justificação está disponível para os que creem em Jesus e têm fé no que alcançou com o derramamento do seu sangue.

Aqui temos as pistas para o entendimento do que conseguiu o sacrifício de Cristo. Enquanto foi demonstrada a justiça de Deus, então o perdão pode ser acessível para os que creem em Jesus.

Assim sendo, podemos perguntar: Porque foi a crucificação uma declaração da justiça de Deus? Vejamo-lo deste modo. Jesus foi um descendente mortal de Adão, e em todos os sentidos um verdadeiro representante da raça humana, ainda que sem pecado. Era correto que alguém como ele morresse? Estava Deus a ser justo ao requerer a sua morte? Através da sua oferenda voluntária Jesus declarou que assim era. Ele diria de fato, "Deus atuou corretamente ao castigar Adão. Esta é a forma como a condenada natureza humana deve ser tratada."

Com a supremacia e justiça de Deus agora reconhecidas a situação do Éden tinha sido agora revertida. Onde a supremacia de Deus tinha sido desafiada e a Sua justiça impugnada, agora a Sua justiça tinha sido publicamente demonstrada. Sobre esta nova base Deus oferece o perdão, não a todos, mas aos que se identificam com esse sacrifício. Isto requererá maior elaboração posterior, mas basta dizer neste ponto que aqueles que creem em Jesus serão tornados justos tal como Deus é justo:

"Rogamos que vos reconcilieis com Deus. Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus." (2 Coríntios 5:20-21)

Logo, o homem pecador e injusto será considerado justo por Deus se crê em Jesus, com tudo o que isso envolve. Assim o castigo do Éden foi revertido.

ERGUIDO DE NOVO PARA A NOSSA JUSTIFICAÇÃO

Devemos considerar outro aspeto que advém do Cristo sem pecado. Visto que a morte é o castigo pelo pecado, e Jesus jamais pecou, lemos que "ao qual, porém, Deus ressuscitou, rompendo os grilhões da morte; porquanto não era possível fosse ele retido por ela." (Atos 2:24). Na sentença da serpente foi predito que o descendente da mulher, no processo de aniquilar o pecado, sofreria uma ferida temporária. Assim a morte de Cristo mostrou-se ser somente temporária. Deus ressuscitou-o de entre os mortos.

A ressurreição de Jesus é um aspeto essencial da redenção que ele conseguiu alcançar. Pela sua ressurreição os benefícios do seu sacrifício estão disponíveis para os crentes. Ao falar da justiça disponível através de Jesus, Paulo diz que será imputada a todos que crerem:

"naquele que ressuscitou dentre os mortos a Jesus, nosso Senhor, o qual foi entregue por causa das nossas transgressões e ressuscitou por causa da nossa justificação." (Romanos 4:24-25)

Por conseguinte a ressurreição de Cristo é essencial para a salvação do crente:

"E, se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé, e ainda permaneceis nos vossos pecados." (1 Coríntios 15:17)

Com o quadro completo do propósito de Deus para a terra nas nossas mentes podemos ver a veracidade destas palavras. O plano de Deus não podia completar-se sem a ressurreição de Jesus. O Jesus agora ressuscitado tem o papel essencial de ser o nosso mediador no céu (Romanos 8:34; 1 Timóteo 2:5; Hebreus 4:14-15), e Deus por sua causa perdoa os pecados do crente. Também a vida eterna que se tornou possível pelo sacrifício de Cristo será dada no seu regresso à terra. Um Jesus que tivesse permanecido no túmulo não poderia ser mediador e redentor.

O resultado deste sacrifício amoroso de Jesus será o estabelecimento dum completo companheirismo entre o homem e o seu Criador quando o Reino de Deus for finalmente estabelecido na terra. A morte desaparecerá completamente ao final e será removida a barreira que separa os homens de Deus. Como partilhamos as ações de graças, louvores, e adoração que são devidas ao único que por sua morte tornou tudo possível e quem, exceto Deus, tonou-se a maior pessoa de todo o universo!:

"Digno é o Cordeiro que foi morto de receber o poder, e riqueza, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e louvor... porque foste morto e com o teu sangue compraste para Deus os que procedem de toda tribo, língua, povo e nação." (Apocalipse 5:12,9)

A GRAÇA DE DEUS

Nos nossos dias, em que os "direitos" do homem são objeto de múltiplos comentários e argumentos, é valioso notar que no que se refere à sua salvação o homem não tem "direitos" de nenhum tipo. Se Deus tivesse escolhido não salvar o homem ninguém teria podido apresentar uma objeção válida. Mas incrustado em todo o ensino Bíblico acerca da salvação do homem encontra-se o fato da graça de Deus para com o homem. A graça é favor imerecido, e Deus demonstrou isto em abundante medida "pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores" (Romanos 5:8). Todo o seu plano é uma prova do Seu amor para com a raça caída que é completamente incapaz de ajudar-se a si mesma. Quão agradecidamente os escritores do Novo Testamento reconhecem isto! Ao falar de Jesus disse Paulo:

"No qual temos a redenção, pelo seu sangue, a remissão dos pecados, segundo a riqueza da sua graça." (Efésios 1:7)

"A fim de que, como o pecado reinou pela morte, assim também reinasse a graça pela justiça para a vida eterna, mediante Jesus Cristo, nosso Senhor." (Romanos 5:21)

"Na realidade, nenhum homem ou mulher ganhará jamais o Reino de Deus pelos seus próprios esforços. Paulo de novo recorda-nos disto:

"Que nos salvou e nos chamou com santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus." (2 Timóteo 1:9)

PERDÃO PARA TODOS?

Agora perguntamos: Já que Cristo morreu e a justiça de Deus foi demonstrada, diria-se que a raça humana na sua totalidade foi perdoada dos seus pecados? Não. Já vimos que o perdão estender-se-á unicamente aos que creem em Jesus e no que a sua morte conquistou. Muitas outras passagens ensinam isto. Jesus disse que o seu Pai

"...deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna." (João 3:16)

Ou como o Salvador de novo disse:

"Quem crê em mim, ainda que morra, viverá." (João 11:25)

É necessário que o pecador reconheça o seu estado pecaminoso, olhe para Jesus a morrer na cruz e diga: "Eu sinceramente creio que tu fizeste isto por mim, e que através do teu sacrifício amoroso todos os meus pecados podem ser perdoados e posso reconciliar-me com Deus". Ao ter-se convertido em crente, deve haver uma confissão pública dessa fé em Jesus, tal como a sua declaração foi pública na cruz. Paulo diz de novo:

"Se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo." (Romanos 10:9)

O tema da resposta do crente à vida e obra de Jesus é tão vital que merece um capítulo à parte. Mas antes de abandonar o capítulo atual permita-me resumir o ensino da Bíblia sobre o pecado e a sua remoção.

RESUMO

Neste capítulo vimos que o pecado é primeiramente uma tendência intrínseca do homem que o impede viver de maneira aceitável a Deus. Em segundo lugar, descreve o ato daqueles que conhecem a vontade de Deus mas violam os Seus mandamentos. O efeito do pecado é a separação de Deus, a experiência do mal e o sofrimento e finalmente a morte.

Do Antigo Testamento, o qual tem o apoio dos escritores do Novo Testamento, aprendemos que o pecado e a morte entraram no mundo por causa da desobediência dos nossos primeiros pais. Mas ao mesmo tempo que sentenciava Adão e Eva, Deus prometia a vinda dum descendente de Eva o qual destruiria o poder do pecado.

Jesus foi este prometido salvador, e pela sua vida perfeita e sacrifício amoroso na cruz tornou possível que Deus perdoasse os pecados do homem dando-lhe assim imortalidade no Reino de Deus, quando a brecha criada no Éden for finalmente fechada.

Este perdão é oferecido aos que primeiro creem na obra de Jesus e logo se associam com ele no caminho que Deus prescreveu.

Mais que tudo, o presente capítulo deste estudo tem uma aplicação pessoal. Cada um de nós necessita do perdão de pecados e libertação da morte. Também vimos como Jesus Cristo pode tornar-se em Redentor tanto seu como meu.

Qual será a nossa reação a isto?

Índice